De repente, as velinhas de seu aniversário não começam mais com o algarismo 1. Acabou, meu bem. Se tiver sorte, poderá voltar a ver tal número nessa posição quando completar 100 anos. Para isso, evite as drogas, procure dormir oito horas por dia e fuja do stress. Ou não faça nada disso, já que Keith Richards está aí para desmentir os médicos e sambar sobre a cautela, afinal.
Passar dos 20 aos 30 é atravessar uma corda bamba a equilibrar um bocado de coisas importantes sobre braços, ombros e costas. A gente só mergulha nessa travessia porque não sabe direito o que tem do outro lado, mas é provável que as escolhas mais decisivas da vida sejam feitas nesse período.
Aos vinte e poucos, algumas coisas estranhas começam a acontecer. A fase fanfarrona da faculdade chega ao final e é preciso começar a trabalhar com seriedade, mesmo que você não tenha a menor ideia do que está fazendo. As pessoas repetem incansavelmente que essa é a melhor fase da vida e que é preciso viajar e curtir muito, mas o vazio da conta bancária simplesmente não faz sentido. Engraçado como todo mundo é cheio de conselhos nostálgicos para tal fase da vida, como se oferecê-los pudesse remediar os erros que — mal sabem eles! — tiveram que ser cometidos para que os acertos finalmente viessem. As celebridades que ditam uma série de comportamentos (inclusive os seus!) são, muitas vezes, mais jovens que você. A profissão outrora escolhida com certeza e amor começa a mostrar as garras, fazendo questionar se é aquilo mesmo que você quer para o resto da vida.
Alguns amigos se casam e têm filhos num surreal piscar de olhos, mas outros se resignam a negar a vida adulta e decidem se acoplar eternamente ao sofá. Talvez você esteja em um desses dois grupos, talvez não. As baladas vão ficando mais escassas, porque um estranho pingo de juízo começa a lembrar que a ressaca é dolorida e bastante real. Aquelas amizades eternas que geravam longos depoimentos no Orkut vão se desfazendo e permanecem apenas as verdadeiramente sólidas, mas não são necessárias tantas provas explícitas de amor. Sua vida amorosa vai ficando mais discreta e algumas variáveis nunca antes pensadas brotam de algum recôncavo da consciência que agora faz companhia de vez em quando: casar ou não? Ter filhos ou não? Morar junto ou não? Por que diabos não nos avisaram que as contas não se pagam sozinhas?
Já perto dos 30, as propagandas de creme anti-idade parecem ser direcionadas como uma flecha a você. “Prevenção” passa a ser palavra de ordem, o mantra “v1d4 l0k4” vagarosamente vai cedendo lugar a “equilíbrio” e os términos de namoro já não são mais tão apocalípticos quanto antes. Por incrível que pareça, a figura da mulher balzaquiana — segura e fatal — vai se tornando mais interessante e convidativa que a de lolita. Você já sustenta opiniões próprias e começa a ler mais livros e pessoas, selecionando ambos de forma criteriosa. Se for para mudar de profissão, a hora é agora, já que ainda resta um pouquinho de falta de juízo. Lá pelos sessenta, talvez se possa concluir que os momentos de maior juízo sejam mesmo os lapsos de inconsequência.
Ali, perto dos 30, talvez você não tenha decidido tanto quando gostaria, mas certamente saberá o que não quer para sua vida. É provável que tenha feito as pazes com o próprio cabelo e definido um estilo de se vestir, mesmo que ele seja um grande e delicioso pout pourri que reflita sua alma colorida e levemente confusa. Ali pelos 30, você não engolirá mais tantos sapos e verdades maquiadas, mas aprenderá a ter paciência com os que tentam vendê-las. Ali pelos 30, você perceberá que, desde os 20, esteve treinando, caindo, se machucando, se excedendo e “fuzaqueando” para entrar radiante nos 30 e viver uma nova década dessa vida que, por mais que se tente definir em calendários, crônicas, velas e palmas, não passa de um incrível desordenado de dias a serem vividos um de cada vez.
Por: Lara Brenner @ Revista Bula