Reflexão

Enfermeira adopta menino com paralisia cerebral abandonado pelos pais

Muitos são os casais que sonham em ser pais, mas que, infelizmente, por algum motivo, não conseguem, acabando por optar pela adopção. Contudo, nem todos estão dispostos a adoptar uma criança com alguma deficiência física ou mental, até porque isso implica não só cuidados acrescidos, como por vezes, elevados gastos financeiros, que nem todas as famílias têm capacidade de suportar. Além do tempo e disponibilidade a que obriga, alterando por completo toda a nossa vida.

Ainda assim, tudo isso não foi entrave para que a enfermeira Solange Maria Pires, de 56 anos, decidisse adoptar Ronei Gustavo Pires, de 12 anos, que foi abandonado pelos próprios pais, quando ainda nem tinha um ano de idade.

Ao ter nascido com agenesia do corpo caloso, uma má-formação congênita na qual a criança não possui a estrutura que conecta os dois hemisférios cerebrais, além de ter também neuropatia crônica, possivelmente causada pela falha na formação do cérebro, que atinge o sistema nervoso e afeta o desenvolvimento de funções como a postura e os movimentos, Ronei sempre sofreu de graves convulsões, tendo-lhe provocado uma broncoaspiração – que acontece quando alimentos ou líquidos são aspirados pelas vias aéreas. Infelizmente, a família biológica demorou para procurar ajuda, o que acabou por agravar ainda mais a sua situação, tendo sido diagnosticado com paralisia cerebral com apenas oito meses e, desde então, passou a viver em estado vegetativo.

Ronei acabou por ser internado diversas vezes no hospital, tendo sido posteriormente levado para um lar para crianças, após pedido da equipe médica que o atendia, pois estes consideraram que a sua família biológica não lhe dava os cuidados adequados à sua situação. Mais tarde, a Justiça de Mato Grosso acabou por determinar que o Estado custeasse serviços de home care – internação domiciliar – para a criança, devido ao facto de esta precisar de cuidados médicos constantes.

Foi precisamente aí que Solange conheceu Ronei, pois esta trabalhava na empresa que prestava os serviços home care a Ronei.

Não tendo casa com as condições necessárias para o serviço de home care, Ronei ainda permaneceu durante alguns meses num quarto adaptado na própria empresa do serviço. Contudo, a dona da empresa acabou por informar que este não poderia ficar mais tempo no quarto em questão, e foi então que Solange se ofereceu para ficar com a guarda deste temporariamente, até a família biológica ter condições para cuidar do pequeno, que na altura tinha cerca de dois anos.

Após lhe ter sido concedida a guarda provisória pela justiça, a enfermeira adaptou o quarto da filha que havia casado poucos meses antes, para receber o menino e os equipamentos da internação domiciliar – como um tubo de oxigénio e um aparelho de ventilação mecânica. Na altura, Solange acabou por ter de deixar o seu trabalho na empresa, continuando a trabalhar no hospital de Cuiabá.

Durante o período de um ano, os pais biológicos de Ronei apenas o visitaram uma vez.

“Eles foram na empresa de home care, para saber da casa que a Justiça tinha determinado que conseguissem. Eles foram informados que o filho estava com uma família, mas nunca me procuraram“, contou Solange ao G1, dizendo que a última vez que os viu foi no início de 2010, no Fórum de Cuiabá.

“A juíza me convocou e pensei que os pais queriam a guarda dele. Eu disse a ela que, caso eles quisessem de volta, seria um direito deles. Mesmo que isso me entristecesse, não poderia fazer nada. Mas a juíza me disse que os pais falaram que não tinham condições psicológicas, nem financeiras, para ficar com o Ronei. Eles abriram mão do filho, disseram que eu poderia criá-lo”, contou.

“Não tive dúvidas, disse que o Ronei era meu filho e que ficaria com ele”, diz Solange. “A juíza me perguntou duas vezes, porque queria que eu tivesse certeza da responsabilidade que teria pela frente. Novamente, disse que era aquilo que eu queria. Não iria abrir mão do meu filho”, contou a enfermeira, que recebeu apoio dos dois filhos, de 33 e 37 anos.

Desde então, o pequeno Ronei vive no seu quarto, passando o dia deitado na cama e recebendo ajuda profissional constantemente.

Apesar de nunca ter andado, Ronei passa por acompanhamento com fonoaudiólogo e com fisioterapeuta – serviços incluídos na home care para auxiliar no desenvolvimento dele. Contudo, devido ao facto de não se mexer normalmente, os seus músculos ficam tensos, os tendões se retraem e encurtam, piorando o seu estado há medida que os anos vão passando.

“Uma médica me disse que ele viveria somente até os oito anos, mas ele está aqui comigo até hoje. Acho que o que mantém vivo é o amor que ele recebe”, disse.

A única coisa que Solange deseja é que, quando chegar a hora do seu filho ir, que vá sem dor.

“Também peço a Deus para que eu não morra enquanto o Ronei estiver aqui. Por que quem vai cuidar dele do jeito que cuido? Quem vai dar toda a atenção? Espero que Deus me atenda. Depois que ele partir, posso ir sossegada. Mas antes, preciso continuar por aqui.”

Fonte: G1

Sábias Palavras

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