Eu sempre gostei de observar a passagem do tempo. Nas estações do ano, sempre gostei de ver as flores nascendo e a natureza ganhando outra vez vida, após todo o frio cinza do inverno. Nas pessoas, gosto de ver as sutis diferenças e marcas que o tempo nos deixa, ano após ano. Gosto de fotos antigas, de cartas amareladas e aquele cheirinho de livro guardado, tão característico.
E em mim mesma, gosto quando constato os efeitos colaterais do Tempo, da Vida. Algumas cicatrizes a mais, é verdade, mas, com elas, muitas memórias e, com certeza, algum aprendizado. Dou risada dos meus cabelos brancos e da minha falta de disposição para certas atividades que me empolgavam tempos atrás. Eu gosto mesmo de olhar para trás. Gosto de analisar quanta estrada percorri, quanta pedra pulei, quantas vezes fui capaz de me levantar depois de cair. Gosto de ver a tempestade se dissipando e o céu azul voltar a abrir.
Eu desconheço sensação melhor que olhar tudo isso, respirar fundo, preencher os pulmões, sorrir e dizer: “Enfim, acabou. Eu sobrevivi.”
Porque às vezes a gente se torna mesmo sobrevivente. Sobreviventes de nós mesmos. Dos maçantes dias que insistem em não passar, das tempestades que nos causamos; do sofrimento que poderíamos ter evitado. Em outras vezes, somos sobreviventes das tsunamis que outras pessoas criaram na nossa paz, mas o importante, é que, de um jeito ou de outro, sobrevivemos. Chegamos até aqui, aos trancos e barrancos.
Nem sempre saímos inteiros, algumas vezes deixamos pedaços de nossos corações por aí… algumas vezes saímos amargurados. Outras tantas vezes saímos sem querer, de fato, sair. Mas vamos porque acreditamos plenamente ser o melhor para nós e isso é um ato de amor-próprio; de resistência. Algumas vezes saímos carregando pesos demais, culpas obesas, raiva excessiva; e outras vezes saímos sem absolutamente nada, recolhendo só a carcaça, quando até a alma parece já ter nos deixado. Nessas vezes, pensamos que nada de bom nos resta e nos sentimos na lona, sem forças sequer para pedir ajuda e acreditamos ser o fim. E é.
Mas nem todo fim precisa ser ruim ou melancólico. Toda metamorfose dessa vida precisa de um fim. Sem finais não existem recomeços. Ah! E como recomeços são lindos! A fase gestacional precisa terminar para que a vida se concretize. O casulo precisa morrer para que as asas sejam libertas. O ovo precisa se quebrar em várias partes, para que a ave viva.
As flores secas precisam cair, para que novas e lindas flores floresçam.
Tudo aqui no nosso planeta está em constante e ininterrupta evolução, tudo que está parado é porque já morreu. Incluindo nós, humanos. Somos altamente metamórficos. E para as mudanças ocorrerem, finais de ciclos são necessários.
Claro que, graças ao neocortex que desenvolvemos, as mudanças às vezes nos apavoram, entristecem-nos e, como humanos, temos certa dificuldade em aceitar rapidamente e isso é normal, faz parte do nosso processo pessoal evolutivo. Mas as mudanças são a única constância dessa jornada por aqui. Por isso, hoje, mesmo sem compreender, eu procuro aceitar, já estive em mares turbulentos antes e acabei por chegar em praias paradisíacas. Tentemos, então, confiar em Deus, nos caminhos do Universo. Vivemos pedindo ajuda e quando Ele muda tudo para corrigir a nossa rota, criamos resistência e jogamos âncora. Mas Deus enxerga muito mais adiante do que nossos singelos olhos são capazes de ver.
Um grande amor às vezes nunca morre, mas a relação chegou ao fim.
Agradecemos pelos bons momentos vividos, limpemos os nossos corações e nos alegremos com tudo que há por vir. E acredite, sempre tem um amor esperando para ser vivido, uma praia esperando para ser descoberta, um bichinho esperando para ganhar uma família; um amigo precisando de um amigo novo; um gosto diferente esperando para se tornar o seu novo preferido. Um lugar desconhecido esperando para ser o seu novo lar; uma parceria inusitada esperando para começar! Sempre existe VIDA para quem não se nega a viver! E como é fantástico RENASCER. Romper a casca; despir-se do casulo; trocar a penugem. Sair da posição fetal do apertado e desconfortável útero não – materno que nos colocamos por medo do mundo.
Como é maravilhoso abrir as asas, aprender a VOAR! Só ganha os céus quem aceita o fim e abraça o novo começo e a sua nova versão. Ninguém sai deste mundo o mesmo que chegou. Se isso acontecer, é porque a vida foi desperdiçada e em vão. Eu sei que você pode estar cansado nesse exato momento em que lê meu texto, mas parabéns por ter chegado até aqui.
Acabou. Você sobreviveu. Agora se dê um pouco de trégua e deixa o tempo fazer seu trabalho. Logo ali à frente tem um lindo amor, uma boa oportunidade e pessoas queridas te esperando. Enfim, depois do fim, é hora de recomeçar. Vale a pena continuar. Estamos juntos.
Por: Bruna Stamato
Imagem de capa: Saahil Photos no Pexels